Inteligência Artificial e a Biblioteca de Babel - Em Busca de Futuro #001
Como a literatura latina pode nos ajudar a refletir sobre até onde vão as IAs generativas
Bem-vindos ao primeiro Em Busca de Futuro! Na edição de hoje, vamos misturar no nosso liquidificador reflexivo coisas que eu amo: literatura, tecnologia e filosofia. Vou utilizar a literatura como fundo em uma crítica que demonstra que as novas ferramentas de inteligência artificial são realmente muito boas e impressionantes, mas precisamos continuar explorando nossas capacidades essencialmente humanas.
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Inteligência Artificial e a Biblioteca de Babel
No conto “A Biblioteca de Babel” o escritor argentino Jorge Luis Borges nos ambienta em uma biblioteca, aparentemente infinita, composta por diversos andares hexagonais. Os livros dispostos nas estantes possuem todas as possíveis formas de combinar letras, espaços e pontuações. Por exemplo, digamos que em uma estante tem um texto composto apenas por letras “a”, outro livro da mesma prateleira tem quase o mesmo número de letras “a”, mas a última é um “b: , e assim por diante enumerando as mais diferentes combinações.
Sendo assim, é possível dizer que nessa absurda biblioteca podemos encontrar textos que resolvem qualquer problema no mundo. A solução para as desigualdades, a descrição exata dos mistérios da existência e com certeza o mais belo de todos os romances.
O conto de Jorge Luis Borges tem muitas camadas. Todas as vezes que releio, me energizo e me impressiono com a capacidade que ele tem de mostrar o poder da linguagem. A ideia de que, para resolvermos os problemas do mundo, basta organizar letras e palavras em uma determinada ordem, é simples, profundo e fascinante.
O texto de Borges também aborda a dificuldade das pessoas de lidar com a Biblioteca de Babel, tanto na ânsia de, por gerações, tentar explorar todos os segredos daqueles corredores e até mesmo de um grupo que decide queimar livros que consideram inúteis. (E a questão é: será que eram inúteis mesmo ou ainda não tinham capacidade de extrair algo daqueles livros?)
Desde que desenvolvemos a linguagem até hoje, na sociedade da informação, já produzimos muito conhecimento e conteúdo. As inteligências artificiais generativas que tanto fazem sucesso hoje usam de boa parte desse conhecimento gerado como treinamento para seus modelos.
Explicando de forma superficial e básica, para que todos entendam. Os modelos de linguagem de grande escala (LLMs), como o GPT, utilizaram diversos textos produzidos pela humanidade para criar vetores e matrizes nas quais, dado uma entrada que gera um contexto, ele produz um texto de saída calculando a probabilidade de qual seria a próxima palavra naquele texto. As inteligências artificiais não pensam, elas calculam baseadas nos padrões aprendidos.
São ferramentas muito úteis. Nos ajudam a resumir, revisar, pesquisar em grandes volumes de dados, dão aquela empurrada para sair da página em branco e também aceleram nossa capacidade de análise de informações. Todavia uma de suas limitações é: elas agem somente sob o que já foi desvendado e descoberto.
Voltando à “Biblioteca de Babel”, a analogia que quero propor aqui para reflexão é de que, hoje, esses modelos de inteligência artificial generativa apenas conseguem produzir coisas a partir do conteúdo de uma pequena parcela de andares e estantes da nossa biblioteca aparentemente infinita. Estamos longe de esgotar o potencial de nossa linguagem.
A exploração dos andares da biblioteca de babel exige de nós a criação de novas conexões, padrões e combinações possíveis. Exige a busca por cada vez mais formas de gerar ideias e desenvolver o pensamento. Exige desafiar a linguagem, ter curiosidade, criatividade, abertura ao novo e ao acaso. Exige a sede pelo avanço, mas também a repetição para consolidar as ideias. Disciplina, rebeldia, propósito e intuição.
Enfim, características essencialmente humanas.
As ferramentas de IA são poderosas e podem parecer ameaçadoras, mas estão longe de ser tudo o que precisamos para avançarmos como sociedade. Muitas vezes colocamos essas ferramentas em um pedestal, precisamos estar atentos para não esquecer de desenvolver e priorizar o que realmente irá mudar o jogo.
E aí, vocês estão preparados para desbravar a biblioteca de babel?
🔥Fagulhas
(achados e indicações para despertar novas ideias)
Não poderia deixar de indicar o livro de Jorge Luis Borges em que vocês podem encontrar na íntegra o conto utilizado como base para reflexão de hoje. Vale muito a pena:
Ficções - Jorge Luis Borges (Ed. Companhia das Letras)
Nessa semana terminei de ler Capitães da Areia de Jorge Amado. Era um débito que eu tinha com nossa literatura brasileira. Eu amei a leitura e aproveito aqui o espaço para indicar também.
Capitães da Areia - Jorge Amado (Ed. Companhia das Letras)


